segunda-feira, 13 de abril de 2009

Manuel Banderira

Estrela da manhã


Eu quero a estrela da manhã

Onde está a estrela da manhã?

Meus amigos meus inimigos

Procurem a estrela da manhã

Ela desapareceu ia nua

Desapareceu com quem?

Procurem por toda a parte

Digam que sou um homem sem orgulho

Um homem que aceita tudo

Que me importa?

Eu quero a estrela da manhã

Três dias e três noites

Fui assassino e suicida

Ladrão, pulha, falsário

Virgem mal-sexuada

Atribuladora dos aflitos

Girafa de duas cabeças

Pecai por todos pecai com todos

Pecai com os malandros

Pecai com os sargentos

Pecai com os fuzileiros navais

Pecai de todas as maneiras

Com os gregos e com os troianos

Com o padre e com o sacristão

Com o leproso de Pouso Alto

Depois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas comerei terra e direi coisas de

[uma ternura tão simples

Que tu desfalecerás

Procurem por toda parte

Pura ou degradada até a última baixeza

Eu quero a estrela da manhã.




VULGÍVAGA


Não posso crer que se conceba

Do amor senão o gozo físico!

O meu amante morreu bêbado,

E meu marido morreu tísico!

Não sei entre que astutos dedos

Deixei a rosa da inocência.

Antes da minha pubescência

Sabia todos os segredos...

Fui de um... Fui de outro... Este era médico...

Um, poeta... Outro, nem sei mais!

Tive em meu leito enciclopédico

Todas as artes liberais.

Aos velhos dou o meu engulho.

Aos férvidos o que os esfrie.

A artistas, a coquetterie

Que inspira... E aos tímidos - o orgulho.

Este caçôo-os e depeno-os:

A canga fez-se para o boi...

Meu claro ventre nunca foi

De sonhadores e de ingênuos!

E todavia se o primeiro

Que encontro, fere toda a lira,

Amanso. Tudo se me tira.

Dou tudo. E mesmo... dou dinheiro...

Se bate, então como o estremeço!

Oh, a volúpia da pancada!

Dar-me entre lágrimas, quebrada

Do seu colério carremesso...

E o cio atroz se me não leva

A valhacoutos de canalhas...

É porque temo pela treva

O fio fino das navalhas...


Não posso crer que se conceba

Do amor senão o gozo físico!

O meu amante morreu bêbado,

E meu marido morreu tísico!



Consoada


Quando a Indesejada das gentes chegar

(Não sei se dura ou caroável),

talvez eu tenha medo.

Talvez sorria, ou diga:

- Alô, iniludível!

O meu dia foi bom, pode a noite descer.

(A noite com os seus sortilégios.)

Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,

A mesa posta,

Com cada coisa em seu lugar.


Balada das três mulheres do sabonete Araxá


As três mulheres do sabonete Araxá me invocam, me bouleversam, me hipnotizam,

Oh, as três mulheres do sabonete Araxá às 4 horas da tarde!

O meu reino pelas três mulheres do sabonete Araxá!

Que outros, não eu, a pedra cortem

Para brutais vos adorarem,

Ó brancaranas azedas,

Mulatas cor de lua vem saindo cor de prata

Ou celestes africanas:

Que eu vivo, padeço e morro só pelas três mulheres do sabonete Araxá!

São amigas, são irmãs, são amantes as três mulheres do sabonete Araxá?

São prostitutas, são declamadoras, são acrobatas?

São as três Marias?

Meu Deus, serão as três Marias?

A mais nua é doirada borboleta.

Se a segunda casasse, eu ficava safado da vida, dava para beber e nunca mais telefonava.

Mas se a terceira morresse…Oh, então, nunca mais a minha vida outrora teria sido um festim!

Se me perguntasem: Queres ser estrela? queres ser rei? queres uma ilha no Pacífico? um bangalô em Copacabana?

Eu responderia: Não quero nada disso, tetrarca. Eu só quero as três mulheres do sabonete Araxá:

O meu reino pelas três mulheres do sabonete Araxá!



Vou-me Embora pra Pasárgada


Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive


E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água


Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro


De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.

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